4 de março de 2012 às 10:55
Por Waldemar Terr (Repórter de Política) / wter@uol.com.br - wter.blog.uol.com.br
O especialista em Direito Eleitoral, professor Flávio Braga, diz que a Lei da Ficha Limpa vai alcançar, nas eleições municipais de 2012, inclusive fatos ocorridos antes de sua vigência. Ele revela que a lei considera inelegíveis, por exemplo, as pessoas condenadas por ato doloso de improbidade administrativa e pela prática de crimes graves, desde a condenação até o transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena, desde que a decisão condenatória já tenha transitada em julgado ou ter sido proferida por um órgão judicial colegiado.
“Podemos mencionar também os que forem condenados por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais; os que forem excluídos do exercício da profissão, por decisão do órgão profissional competente; os que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo administrativo ou judicial; os magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente ou que tenham perdido o cargo por sentença; os que forem condenados em razão de terem simulado desfazer vínculo conjugal para evitar caracterização de inelegibilidade; etc.”, afirma.
A seguir a entrevista, na qual o professor fala também sobre as regras das eleições municipais.
Jornal Pequeno - Concretamente, o que decidiu o STF acerca da Lei da Ficha Limpa?
Fábio Braga
- O Supremo Tribunal Federal declarou, por maioria de votos (7x4), a
constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa em sua inteireza, validando a
sua aplicação para as eleições deste ano, inclusive alcançando fatos
ocorridos antes de sua vigência. A lei considera inelegíveis, por
exemplo, as pessoas condenadas por ato doloso de improbidade
administrativa e pela prática de crimes graves, desde a condenação até o
transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena. Cumpre
lembrar que a decisão condenatória deve estar transitada em julgado ou
ter sido proferida por um órgão judicial colegiado.
JP - Cite outras hipóteses de inelegibilidades introduzidas pela Lei da Ficha Limpa?
FB
- São muitas. Podemos mencionar os que forem condenados por corrupção
eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou
gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos
agentes públicos em campanhas eleitorais; os que forem excluídos do
exercício da profissão, por decisão do órgão profissional competente; os
que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo
administrativo ou judicial; os magistrados e os membros do Ministério
Público que forem aposentados compulsoriamente ou que tenham perdido o
cargo por sentença; os que forem condenados em razão de terem simulado
desfazer vínculo conjugal para evitar caracterização de inelegibilidade;
etc.
JP - Em sua opinião, qual o grande mérito dessa lei?
FB
- As inovações mais virtuosas foram a ampliação do rol de causas de
inelegibilidade previsto na Lei Complementar nº 64/90 e a unificação em
oito anos de todos os prazos de inelegibilidade, a fim de facilitar o
trabalho dos operadores do direito eleitoral.
Outro grande avanço
da lei é que, para a configuração do abuso do poder econômico ou
político, não será mais considerada a potencialidade de o ato ilícito
alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das
circunstâncias que o caracterizam.
Um exemplo ilustrativo: em um
município com 500.000 mil eleitores, a distribuição de 50 empregos sem
concurso público, por parte do prefeito candidato à reeleição, não
ostenta potencial para alterar o resultado do certame eleitoral, mas
esse ato de improbidade administrativa é revestido de manifesta
gravidade, com aptidão para caracterizar uma conduta abusiva, passível
de punição. Estamos falando de um caso meramente abstrato, virtual, em
tese. Na prática, até um único voto pode decidir uma eleição.
JP - Com a recente decisão do STF, o TCE está autorizado a julgar as contas de prefeito?
FB
- A Lei da Ficha Limpa preceitua que a regra do artigo 71, II, da
Constituição se aplica a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão
de mandatários que houverem agido nessa condição. De sua vez, o referido
artigo 71, II, combinado com o artigo 75, estabelece que compete ao TCE
e TCU o julgamento técnico das contas dos administradores e
responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos. É óbvio que todo
prefeito detém a condição de mandatário e de administrador público.
Sucede que, logo após a edição da Lei da Ficha Limpa, o TSE firmou o
entendimento de que essa inovação legislativa não alcança os chefes do
Poder Executivo, ou seja, não retirou a competência privativa da câmara
municipal para o julgamento das contas de prefeito. Ao contrário dos
tribunais de contas, o TSE considera irrelevante a distinção entre
contas de governo (execução orçamentária) e contas de gestão (ordenação
de despesas). Assim, só nos resta aguardar a publicação do acórdão do
STF para verificarmos como ele enfrentou essa particularidade da Lei da
Ficha Limpa.
JP - Qual a sua opinião acerca dessa controvérsia?
FB
- Consoante a doutrina extraída do artigo “O caso do prefeito ordenador
de despesa”, de autoria do Professor Caldas Furtado (Conselheiro do
TCE/MA), existem dois regimes jurídicos de contas públicas: o regime que
abrange as denominadas contas de governo, exclusivo para a gestão
política do Chefe do Poder Executivo, que prevê o julgamento político
pelo Parlamento e o regime que alcança as chamadas contas de gestão,
prestadas pelos administradores de recursos públicos, que impõe o
julgamento técnico realizado pela Corte de Contas. Eu sou partidário
dessa tese.
JP - Já foi publicada a “lista de inelegíveis” do Tribunal de Contas?
FB
- Até o dia 5 de julho os tribunais de contas (TCE e TCU) devem
disponibilizar para a Justiça Eleitoral a relação dos gestores públicos
cujas contas houverem sido julgadas irregulares nos oito anos
imediatamente anteriores à realização da eleição. Com fundamento nessa
listagem, o Ministério Público Eleitoral e os demais legitimados poderão
propor a ação de impugnação ao pedido de registro de candidatura. Na
verdade, não é uma lista de inelegíveis, porquanto a simples inclusão do
nome do agente público nesse rol não gera inelegibilidade, por se
tratar de procedimento meramente informativo. Somente a Justiça
Eleitoral possui competência para decretar inelegibilidade. Assim, pelo
fato de constar nessa listagem não significa que o indivíduo já possa
ser considerado um ficha suja.
JP - Qual deve ser a expectativa dos pré-candidatos que figurarem nessa lista?
FB
- O ajuizamento das ações de impugnação com fundamento na rejeição de
contas públicas é inevitável. Faz parte da disputa política e do anseio
de lisura no processo eleitoral. Ao candidato impugnado só resta se
defender com alegações convincentes e tentar comprovar que não está
incurso na causa de inelegibilidade decorrente da desaprovação de
contas. No Maranhão há centenas de ex-titulares de cargos e funções
públicas com contas rejeitadas pelo TCU, TCE e Câmaras Municipais.
JP - Quais os principais prazos de desincompatibilização?
FB
- O site do TSE disponibiliza aos candidatos uma tabela de prazos de
desincompatibilização elaborada com base na legislação e na
jurisprudência. Alguns prazos são diferenciados para os cargos de
prefeito e vereador, o que requer atenção redobrada dos interessados.
Alguns exemplos: servidor público em geral (três meses), dirigente
sindical (4 meses), secretários municipais e de estado (4 meses para
prefeito e 6 meses para vereador).
JP - Quais as principais sanções aplicáveis a quem realiza propaganda eleitoral antecipada?
FB
- A propaganda eleitoral somente será permitida a partir de 6 de julho
de 2012. A prática da propaganda eleitoral antecipada sujeita o
responsável pela divulgação e o seu beneficiário à imediata retirada da
publicidade ilegal e à multa no valor de R$ 5.000,00 a R$ 25.000,00.
JP - Qual a consequência jurídica para a desaprovação das contas de campanha eleitoral?
FB
- Na sessão administrativa da última quinta-feira, o movimento pendular
da jurisprudência do TSE nos surpreendeu mais uma vez. Por maioria de
votos (4x3), os ministros fixaram a exigência de aprovação das contas
eleitorais para a obtenção da certidão de quitação eleitoral. Essa regra
foi introduzida na eleição de 2008 e abandonada no pleito de 2010,
quando era exigido apenas a mera apresentação das contas. Agora foi
restaurada no texto da resolução que dispõe sobre prestação de contas do
pleito de 2012. A ministra Nancy Andrighi destacou que existem mais de
21 mil ex-candidatos que tiveram contas reprovadas. Sem a quitação
eleitoral, o sujeito não pode obter o registro de sua candidatura e, em
consequência, não pode participar da disputa eleitoral de 2012. No
Maranhão, há casos de parlamentares que se encaixam nessa situação,
visto que tiveram as contas da campanha de 2010 rejeitadas pela Justiça
Eleitoral.
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